Uma história de devassos
- Redação

- 30 de mai. de 2019
- 2 min de leitura
É uma decisão quase ruim começar uma coluna de recomendações culturais indicando um livro de 552 páginas em um Brasil que não tem o hábito de ler.
Entretanto, por se tratar de uma plataforma que pretende discutir a diversidade sexual e de gênero na cultura nacional, como faz a Pluralismos, é fundamental começar pelo início e no princípio era o “guei”, essa forma abrasileirada que protagoniza Devassos no Paraíso, de João Silvério Trevisan.
O livro é o mais certeiro de todos os compilados que estudam como a população LGBTQI foi tratada no Brasil ao longo da história. Nos momentos em que a repressão aperta, como o que vivemos, é essencial descobrir como os nossos antepassados sobreviveram em contextos ainda mais cruéis.
O relato de João Silvério Trevisan é essencial por nos deixar claro que antes mesmo de a primeira caravela aportar na América (e ela se chamava Pinta, inclusive) já havia documentação de uma intensa diversidade sexual no nosso país. E essa pluralidade, mesmo perante toda forma de violência, permaneceu... ativa.
Assim, a opressão que tenta sufocar nosso desejo, ela mesma será o motor da nossa luz e da nossa dança de vaga-lumes na noite. Quanto mais escuridão dos opressores, maior será a luz emitida pela purpurina dos oprimidos. - Devassos no Paraíso
O estudo do autor é tão certeiro que marcou gol duas vezes: lançado em 1986, o livro ganhou uma edição ampliada no ano passado, que trouxe a obra de volta aos holofotes. Na nova versão, Trevisan trata de temas que ainda engatinhavam nos anos 1980, como a Aids, mas também se preocupa em manter a essência da obra como um fruto do tempo em que ela foi escrita.
Por isso, pode causar certa confusão ao leitor mais engajado ver termos em desuso, como “travesti” e “GLS”. Não se engane, eles estão ali como os fósseis que são. “Pareceu-me importante que as gerações LGBT posteriores possam aferir como as gerações anteriores se expressavam de acordo com as especificidades de seu tempo”, justifica o autor no prólogo.
A leitura de Devassos no Paraíso é, além de didática, extremamente divertida. Mais que um pesquisador, João Silvério Trevisan é um ótimo escritor (para comprová-lo, vale a pena conhecer algumas de suas outras obras, como Pai,pai). A devassidão que ele nos expõe em palavras é tão divertida quanto… bom, quanto a devassidão em si.
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